Portugal e Espanha - Pequenas notas comparativas
 
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Portugal e Espanha - Pequenas notas comparativas

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Portugal e Espanha - Pequenas notas comparativasNuma das passadas semanas, o artigo de San Payo Araújo que descrevia o pensamento do treinador espanhol  Josep Bordas acerca de Collel, despoletou um comentário crítico da parte de João Videira.

Para além das respectivas respostas de San Payo e de um pequeno comentário que na altura produzi, parece-me que há matéria de reflexão a acrescentar.

Dizia João Videira que embora lhe parecessem interessantes os artigos de San Payo, Portugal não estava a seguir, como deveria, o exemplo da Espanha no Minibasket. Se posso sintetizar a crítica dele, em Espanha, mesmo neste nível etário, havia competição a sério. Aqui, não. Andamos a perder tempo em brincadeiras e cantigas. Na altura resolvi comentar dizendo que a crítica de Videira me parecia não fundamentada e imerecida pois dirigia-se a alguém com uma intervenção no terreno de grande qualidade. Como estaríamos nós bem melhor, a nível da formação técnica dos nossos minibasquetistas, se o nível de intervenção dos nossos treinadores correspondesse ao exemplo que lhes era dado pelo actual responsável técnico da federação. E para além dessa qualidade técnica existe uma qualidade humana que é o complemento fundamental da intervenção técnica e que sem a qual, o desporto não vale a pena, na minha opinião.

Aqui, porém, quero ir bem mais além do anteriormente referido. Acho que em primeiro lugar é necessário contextualizar histórica e socialmente o que se passa no basquetebol. Aqui e em qualquer país. Estou de acordo que Espanha é um exemplo para nós. Mas acho que mais do que ser um exemplo pelo seu presente tem também de ser um exemplo, em primeiro lugar, pelo seu passado. É no seu passado que devemos buscar muito das razões do seu sucesso actual e que já existe, lembre-se, há várias décadas. É à volta disso que alinharei as próximas linhas.

Nos anos sessenta, Espanha importou o Biddy-basket, criação norte-americana de Jay Archer em 1951 e que se destinava a ser uma adaptação do basquetebol para as crianças. Ora, Espanha ou mais propriamente alguns dirigentes do basquetebol Espanhol desse tempo (caso de Anselmo López), aproveitando o apoio estatal do Conselho Superior de Desportos, resolveu lançar uma operação em grande escala: “100 000 praticantes de Minibasket”. E conseguiram atingir essa meta já nesse tempo. É preciso também não esquecer que foram os espanhóis que baptizaram diferentemente – como Minibasket - este novo desporto para crianças, sendo que parece que o seu criador Jay Archer não terá ficado muito satisfeito com a gracinha. Ainda hoje lá nos “states” o jogo é conhecido como Biddy-basketball, como se pode verificar no site respectivo onde está descrita a história do jogo.

Essa operação dos cem mil jogadores teve um grande sucesso e foi em si própria um factor essencial para o desenvolvimento futuro do basquetebol espanhol. Evidentemente, a grandeza de Espanha em número de cidadãos – e de crianças, claro – faz com que a massa de seleccionáveis seja enorme em comparação com países mais pequenos. Desse ponto de vista qualquer comparação com Portugal ficaria desde logo limitada, devendo assim, da nossa parte, termos consciência disso (por isso San Payo respondia a João Videira que a possibilidade estatística de termos Ricki’s Rubios era bem menor). Depois, também é sabido que muitas das “políticas” federativas e clubísticas do basquetebol espanhol tomadas há décadas, como a importação de bons jogadores (ou técnicos) estrangeiros que serviram (e servem) de referência e ajudaram nos saltos qualitativos do basquetebol, foram apostas ganhas. Estamos agora a ver, nos resultados superiores de todas as selecções espanholas, o resultado de muitos anos (décadas mesmo) de trabalho de muita gente, de políticas sustentadas e de apoios do poder político ao desenvolvimento desportivo. O basquetebol em Espanha é algo que passou a ser uma realidade social com um peso enorme. Vemos como existem campos para a prática do basquete de rua espalhados pelas cidades e campos de Espanha. A paisagem de Espanha é salpicada por muitos campos e tabelas de basquetebol. Como é diferente para pior em Portugal, onde em certas cidades é mais fácil encontrar alfinetes no chão do que cestos no território.

E aqui em Portugal, o que aconteceu ou não aconteceu? O apoio ao desporto pelo poder político sempre foi muito deficitário, com a excepção de períodos de tempo muito curtos. A massa de potenciais praticantes é relativamente limitada e ainda por cima é disputada concorrencialmente com outros desportos. O Futebol, como sabemos, foi transformado num eucalipto desportivo que seca apoios que podiam e deviam ser canalizados para os outros desportos. Os dirigentes desportivos das ditas modalidades amadoras – como o basquetebol também é considerado, - nem sempre tomaram decisões acertadas na promoção do nosso basquetebol . Enveredamos a dado passo pela profissionalização de um sector de basquetebol sem que existisse público e/ou dinheiro para isso. Importaram-se e importam-se vários jogadores de duvidosa qualidade que ocupam o espaço necessário para os jovens jogadores portugueses com reflexos na qualidade das futuras selecções. Os treinadores, depois de uma fase em que mostraram saber estar unidos como factor de desenvolvimento do basquetebol e da sua própria identidade e qualidade, deixaram cair a sua Associação (ANTB), a qual, só agora se levantou, felizmente. Temos treinadores de grande qualidade se individualmente considerados mas a comunidade de treinadores é algo que é preciso (re)construir.

Sobre o nível de jogo

Comecei este escrito dizendo que era necessário contextualizar sócio-historicamente o desenvolvimento do basquetebol, em Portugal ou em qualquer lado. Cumprindo esse princípio, que acho fundamental, desenvolvo seguidamente algumas ideias.

Acho muito natural que no Minibasket, em Espanha, existam fases de competição de elevado nível, competições ao nível nacional, tipo campeonatos de Espanha para crianças/jovens de 12 anos. Poderão ser o corolário natural – na minha opinião - relativo a essa idade, de um desenvolvimento desportivo nacional, por um lado, e do desenvolvimento do nível de jogo atingido por esses jovens basquetebolístas que já levam com certeza muitos anos de prática do jogo. Espanha é um país que respira basquetebol como cá muitas crianças e jovens respiram futebol. Começam a brincar ao jogo em idades muito novas, vêem regularmente exemplos do bom jogo na televisão e nos campos dos seus clubes. Daí poder ser socialmente e psicologicamente “natural” que o nível de jogo atingido seja muito elevado e que se possa considerar perfeitamente aceitável a existência de fases competitivas nacionais mesmo em idades muito novas. De qualquer forma, condiciono pessoalmente a minha opinião sobre esses “campeonatos” à análise do conteúdo do que acontece dentro dos jogos e nas suas envolvências. E sobre isso confesso o meu desconhecimento para poder fazer um juízo de valor ponderado. É preciso sempre acautelar a criança e o jovem que existe no “jogador” de basquetebol. Estou em completo acordo com San Payo Araújo quando ele diz que as crianças estão sempre primeiro e são o mais importante do jogo. Também o espanhol Josep Bordas diz o mesmo e o mesmo dizia, há há mais de quarenta anos, o professor Mário Lemos, grande mentor do nosso minibásquete (com contributos para o MB internacional). Com as crianças existem dois perigos, o do excesso e o do defeito. Ou se sobrestimam as suas capacidades e se fazem correr riscos desmesurados inclusive na sua saúde, ou, no outro extremo, se substimam as capacidades das crianças que são também socialmente e historicamente condicionadas, fazendo com que elas fiquem subdesenvolvidas. O melhor lema que conheço relativamente a esta questão pertence ao grande professor e treinador de basquetebol francês, Robert Mérand: “Nem prática inconsistente, nem prática inconsiderada do desporto pelas crianças”. Quando a prática é inconsistente, deixa-se a criança ao sabor de um jogo que não a desenvolve satisfatoriamente. Quando se opta por uma prática inconsiderada, submetem-se as crianças a cargas físicas e psicológicas para as quais não estão preparadas. Saber onde se situa este espaço entre o inconsistente e o inconsiderado não é algo muito fácil de encontrar. Mas quando quem orienta o processo educativo é alguém que está preocupado verdadeiramente com o bem-estar e o desenvolvimento óptimo das crianças existe uma boa garantia de sucesso.

Uma nota mais técnica

Muitos de nós, treinadores, afirmámos que em certos escalões do basquetebol não se devem fazer, ensinar, exigir, certas coisas: por exemplo, não se devem fazer bloqueios, ou não se deve defender à zona. Ora também aqui, nestes pormenores técnicos penso que é preciso fazer a tal contextualização sócio-histórica de que falei anteriormente. Em países como os EUA ou na nossa vizinha Espanha, crianças muito jovens, pelo que vêem e praticam do basquetebol, sabem os “para quê”, “quandos” e “comos” dos bloqueios. Fazê-los é algo de natural. Mesmo na sua prática livre do jogo os utilizam. Ao contrário, jovens bem mais velhos, que começaram tardiamente a jogar ou que pertencem a sociedades ou envolvências sem grande cultura basquetebolística precisam de bem mais tempo para “saberem” o que as crianças de que falámos já se apropriaram. Com as formas de defesa colectiva ou as formas de ataque, podemos ter raciocínios semelhantes. Quem conhece o passado das técnicas saberá o que se dizia do base dos Celtics, Bob Cousy, nos anos cinquenta do século XX. Afirmavam que ele só conseguia fazer aquelas mudanças de drible por detrás das costas por ter braços anormalmente grandes. Hoje, como sabemos, qualquer criança que brinque ao Mini há algum tempo e que pratique com assiduidade o manejo de bola consegue com os seus pequenos braços fazer essas e outras habilidades mais complexas.

P.S. Mais uma vez não quero acabar este texto sem fazer referência ao contributo do professor Francisco Costa a quem pertencem muitas das ideias que aqui deixei e com as quais concordo. As boas são dele. As menos boas foram as que tive o atrevimento de acrescentar.

 

Comentários 

 
+3 #11 jorge duarte 06-05-2012 00:27
É com interesse que consulto o site,gosto de ler e meditar nos artigos que leio. Temos todos de dar a mão à palmatória, o basquetebol em Portugal está mal, pois enquanto não se lhe olhar o pais como um todo, vamos de mal a pior, com a possibilidade dentro de algum tempo a modalidade ficar reduzida a cinco distritos, perante a falta de iniciativas da FPB.Julgo ser urgente um debate nacional sobre a modalidade e o seu momento.
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+5 #10 Nuno Tavares 05-05-2012 23:08
Parte 2
Uma das grandes lacunas do nosso basquetebol e do desporto em geral é a falta de desporto informal e na nossa modalidade este aspecto é gritante. É IMPORTANTE que as crianças errem, É IMPORTANTE que a prática do basquetebol informal nos campos de rua façam com que cada jovem jogador possa criar a repetição, seja do gesto técnico, seja de um gesto de coordenação motora, e que percebam como evoluir a partir do erro. Claro que a prática desportiva do clube também é importante...mas em Portugal, o basquetebol de formação está muito mecanizado a esquemas e diagramas, onde se retirou a liberdade aos jogadores e introduz-se o ganhar a todos o custo...ganhar leva tempo...e ganhar centrando no correcto desenvolvimento do atleta em todas as componentes, ainda mais tempo leva.
Somos um país onde os valores cada vez mais são um bem escasso, vamos educar, e depois veremos quem pode dar em jogador ou não, mas com a certeza que esse caminho leva a uma vitoria certa para todos!
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+5 #9 Nuno Tavares 05-05-2012 22:58
Parte 1
O artigo é muito interessante...especialmente porque mais uma vez andamos sempre à volta do que não é essencial...e na minha opinião (concordando com San Payo) sem dúvida que o alargamento da base em relação ao numero de jogadores no minibasquetebol é o primeiro passo. Não entendo como é que isto não é mais que claro para todos os que falam da modalidade numa perspectiva mais critica e estrutural. Vivi em Madrid até à pouco tempo, conheci a estrutura da maior associação de treinadores da Europa, que é a associação de treinadores de basquetebol e percebi duas coisas que são bastante claras: sem muitos praticantes Espanha nunca conseguiria chegar onde chegou e que o trabalho a desenrolar é a médio/longo prazo e não para amanhã!!! A partir daqui começamos a estruturar e planear, sem estas duas condições nada faz sentido.
Outro aspecto interessante deste artigo é sem duvida quando Henrique Santos aborda a quantidade de campos de jogo pelos parques das cidades espanholas.
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+10 #8 San Payo Araújo 04-05-2012 15:02
Caro Rui Silva

Obrigado pela informação e é realmente um privilégio trabalhar com jogadores como o Nuno e o Garcia.

Quanto à polémica também penso que teremos de encontrar um caminho que dê respostas à nossa realidade, mas considero que não se está a discutir o fundamental. O essencial não é discutir (campeonatos de mini / atl), não é discutir aprendizagem da modalidade (jogo/fundamentos) a questão fundamental é como e com que meios conseguirmos aumentar a base de praticantes no minibásquete e é muito bom as pessoas discutirem este tema. Mas centre-mo-nos no essencial.
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+8 #7 Rui Silva 04-05-2012 11:18
Já agora entrando na discussão e concordando com os 2 lados: os Portugueses tentam copiar os espanhóis, os espanhóis copiam os americanos, e os outros países como a frança, a alemanha que tem jogadores na NBA, pelo que leio e estudo parece-me que tentam ter modelos próprios adequados à sua própria realidade...acho que temos de ser nós próprios e deixar-mo-nos de imitações....muito embora concorde que temos de olhar para os melhores exemplos
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+3 #6 Rui Silva 04-05-2012 11:13
Caro San Payo os jogadores foram o Garcia e o Nuno Fernandes...
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-6 #5 João Videira 03-05-2012 22:45
Andamos a brincar ao basket, não se percebe nada de basket em Portugal, o senhor dá exemplos de homens da federação... eles fazem o trabalho deles e tem que ser politicamente correctos, vá a Espanha ver jogos de equipas de bairros e aperceba-se que eles jogam uma coisa completamente diferente.
Chega de desculpas, chega de falar de apenas pedagogia, será necessário que lhe relembre que pedagogia é um elemento que deve estar presente em todas as actividades com crianças?!?! Isso não tem nada que ver com os problemas técnicos que enfrentamos. O senhor sabe como eu que não jogamos absolutamente nada a isto, ninguém fala dos exercicios, dos conceitos técnicos, tácticos, só se fala de frases de autor e pouco mais. Sinceramente ou não sabem mais ou não querem dizer, e não me vale em tamanho que há paises bem mais pequenos que o nosso na Europa...
e alguns deles... bem sem comentários! Abraço
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-6 #4 João Videira 03-05-2012 22:40
Caro Henrique Santos, reconheço que é dificil após ter vivido tantos anos segundo um padrão de basket, de repente mudar-se. Tudo isto implica que os treinadores mais velhos ou mais novos, se desconstruam e voltem a nascer de novo para o ensino do basquetebol. Mas se vermos bem não é dificil, basta fazer quase tudo ao contrário do que fazemos e começamos a ir no caminho certo. A qualidade humana é importante mas não é o factor decisivo, quantas vezes na nossa vida conhecemos pessoas altamente competentes e com uma qualidade humana muito baixa?
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+3 #3 San Payo Araújo 03-05-2012 19:24
Caro Rui Silva

Caso não se importe e por uma questão de curiosidade gostaria que me informasse o nome dos jogadores que treinei em Queluz.

Cumprimentos e obrigado pela referência elogiosa
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+5 #2 rui silva 03-05-2012 14:43
ja agora o que escrevi não é dirigido ao San Payo araujo que não conheço pessoalmente, mas tive o privilegio de treinar 2 jogadores formados por ele no Queluz e viu-se a diferença.....
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