Em todas as modalidades há nomes que reservam o seu lugar na história.
Seja pela elegância técnica, pela capacidade física portentosa, por um entendimento táctico superior do jogo, ou por uma presença indómita. Depois há Patrick Anderson. O canadiano de 32 anos contrariou a lógica de endeusamento dos grandes atletas e virou lenda ainda no activo. Ninguém, pelo menos dos que ficam absortos na telepatia entre o cesto e a bola, consegue negar que Anderson é o melhor jogador da actualidade e, provavelmente, de todos os tempos.
Detectar pontos fracos ou vulnerabilidades no jogo de um adversário é um exercício corriqueiro para qualuer treinador ou jogador. Aos adversários de Pat Anderson, esta rotina habitual é-lhes vedada, porque se digladiam com alguém que mora noutra órbita.
Paul Schulte, uma das principais figuras do BCR norte-americano e ávido competidor, afirmou em tom de brincadeira: “Pat Anderson is a freak, he probably was born with a wheelchair attached to him”. As palavras, vindas do arqui-rival dos canadianos, permitem aclarar o culto e a admiração de que é alvo Patrick Anderson, dentro e fora de portas.
A afirmação de Schulte não é de todo um acaso. O astro canadiano é soberano na leitura do jogo, dotado de uma técnica de lançamento em consonância total com os princípios teóricos que fazem dele um atirador de elite, além de demonstrar uma disponibilidade física acima da média, que se reflecte na capacidade incessante de percorrer o campo, como uma flecha, esteja ou não próximo o soar da buzina. Mas não são (apenas) estas virtudes que fazem com que para Anderson seja mais fácil tocar o céu. O controlo absoluto que empreende sobre a cadeira dão uma outra dimensão à máxima de que esta deve ser o prolongamento do corpo do jogador. Com menos “braçadas” do que qualquer outro e uma utilização fantástica do tronco, Patrick Anderson é uma ameaça quase sempre letal no 1x1 e um óptimo ressaltador.
Ainda no que respeita ao manuseamento da cadeira, o equilíbrio numa só roda é um detalhe fundamental para os jogadores interiores em situações de lançamento apertado, de luta pelo ressalto ou em tentativas de desarme de lançamento, embora não seja um recurso exclusivo de quem actua na posição de poste e dependa igualmente da gravidade da lesão do jogador. Anderson, cuja posição é difícil rotular, visto ser um jogador com um desempenho de qualidade semelhante a base, extremo ou poste, não só é um dos mais eficazes na execução do movimento, como o faz de uma forma melíflua e natural.
O video que se segue, venerado por todos os praticantes e fãs de BCR, fala por si.
Carreira e palmarés
O encontro de Patrick com o basquetebol em cadeira de rodas aconteceu em 1990 quando este tinha apenas 11 anos. Dois anos antes, o jovem canadiano fora atropelado por um condutor embriagado, o que obrigou à amputação das suas pernas abaixo do joelho. Deste infortúnio, nasceu um dos atletas mais emblemáticos que os palcos desportivos já viram.
Ainda em tenra idade, com apenas 18 anos, o atleta natural de Edmonton, Alberta, logrou a chamada à selecção nacional do Canadá, um patamar sublime ao alcance de poucos tão precocemente. Neste ano de 1997, Anderson chegou pela primeira vez à glória internacional ao conquistar o campeonato do mundo de juniores e ser eleito o MVP do torneio, feitos que iria repetir quatro anos depois.
Ao nível de clubes, Pat Anderson tem também um pecúlio invejável. Só ao serviço das equipas canadianas Team Ontario, Douglas College Lions e Twin City Spinners contabiliza 11 vitórias, entre campeonatos juniores e seniores, 4 pódios em que foi segundo e 9 distinções como MVP.
Mas a carreira de êxito do mago canadiano não se esgota na sua terra natal. 2003 marca a sua primeira experiência profissional na modalidade ao serviço dos alemães RSV Lahn-Dill, onde ganhou consecutivamente 3 Champions Cup – competição europeia mais importante de clubes. Seguiram-se passagens pela Austrália e, em 2008, pelo conjunto da Universidade do Illinois, na qual estudou, que lhe rendeu o seu único título na NWBA (National Wheelchair Basketball Association).
Voltando aos triunfos de selecções, Patrick venceu o Paralympic World Cup, em Manchester, em 2006, e o Gold Cup World Championships no mesmo ano, em Amesterdão. No entanto, os marcos que o projectam para um universo celeste são as duas medalhas de ouro arrecadadas nos Jogos Paraolímpicos de Atenas (2004) e de Sidney (2000), além da prata alcançada em Pequim, na última edição. Qual a razão do sucesso do BCR canadiano? Anderson, numa entrevista em 2007, diz tudo: “As condições de treino que nos oferecem são fantásticas. E de desenvolvimento também, já que jogamos praticamente o ano todo. Temos apoio do governo, instituições e patrocinadores. Os atletas com deficiência são valorizados no Canadá, não só pela comunidade esportiva, mas pela sociedade como um todo.”
Actualmente, Patrick Anderson veste as cores dos Cologne 99ers, da Alemanha, e, no Canadá, actua nos Douglas College Lions.