E quando o treinador é o pai?

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altHá uma promessa feita já há algum tempo que anda a remoer a minha consciência. O ano passado em resposta a um comentário aos meus artigos disse que ira escrever sobre a situação do pai que é treinador do seu filho.

Esta é talvez a situação mais sensível e complexa que a formação desportiva pode colocar, quer ao adulto, quer ao jovem praticante. Antes de mais há que diferenciar claramente se a modalidade é um desporto individual, se a modalidade é um desporto colectivo. Sendo um desporto individual, o ponto mais visível e sensível desta situação, a complexidade de participação ou não nas competições é bem menor, o problema está muito diluído.

Nos desportos colectivos onde há convocatórias, onde há decisões sobre quem é convocado, quem joga e quanto tempo joga é que as coisas se complicam. Mas as dificuldades não ficam por aqui. Quando o jovem por exemplo é elogiado ou castigado, quem é que está a elogiar ou castigar o pai ou o treinador?

Ser treinador num processo de formação é tarefa difícil e exige como processo educativo os maiores cuidados, pois como diz Séneca a educação influi sobre toda a vida. Mas antes de falar sobre a complexidade desta situação a primeira pergunta que o pai tem de fazer é porque é que eu sou, ou quero ser treinador do meu filho?

A segunda pergunta que o pai deve fazer estou preparado para, sendo o meu filho ter a consciência completamente tranquila, que vou ser o mais justo possível relativamente ao grupo que estou a treinar?

As respostas íntimas e sinceras a estas perguntas condicionam o êxito ou insucesso desta situação. Estas são as repostas que permitem ao pai tomar a decisão e saber se está preparado e deve o não deve ser treinador do seu próprio filho.

Contudo por mais bem-intencionado e por mais justo que o pai/treinador seja, tem de ter consciência que vai estar sempre muito sujeito a críticas.

Muito mais havia a dizer sobre este tema, mas como não gosto que os meus artigos sejam muito alongados, faço apenas dois alertas.

Se as situações estão claras, por exemplo o filho do treinador é indubitavelmente um dos melhores praticantes do grupo, a tarefa do pai está facilitada, de outro modo tudo se torna muito mais sensível.

Mas o pai/treinador não tem que pensar apenas na sua capacidade de lidar com a situação, tem de saber se o seu filho também está preparado para a complexidade da situação. Por exemplo é normal os jovens terem entre eles desabafos ou mesmo fazerem críticas ao treinador. Como vai lidar o jovem com a crítica ao pai?

Levanto aqui algumas questões, que são apenas a ponta do Iceberg, mas continuo a pensar que as respostas sinceras às duas primeiras perguntas são essenciais para perceber a possibilidade de sucesso desta situação.

Nestas coisas, como em tudo na vida não consigo ser fundamentalista. Conheço alguns casos bem-sucedidos e conheço casos, mal ou mesmo muito mal resolvidos. Nas situações mal resolvidas, seja porque foi injustamente beneficiado e com isso, ganha a antipatia dos seus companheiros, ou porque, como forma de protecção do pai, foi prejudicado a principal vítima é sempre o filho do treinador.

 

Comentários 

 
+2 #2 Ponte e Sousa 18-02-2020 11:10
Treinar os meus dois filhos, e a minha Mulher, foram das recompensas mais agradáveis que Deus me deu. Bem haja pela clareza de análise. Concordo a 100%. Com um filho de oito anos, treinando desde os 4 em clube, e outro de 14, treinando desde os 5 em clube, e até aos 14 comigo (este presente ano, fora da minha equipa, treina comigo, nos seniores, de vez em quando) creio ser eu um dos casos que merece ler este seu curto texto com atenção e muito agrado.
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+2 #1 António Jorge 18-02-2020 10:18
Obrigado pela sua reflexão e sábias palavras sobre este assunto. Também estou numa situação em que sou treinador do meu filho, e por ser muito exigente com ele, e estar sempre atento a que não me critiquem por o beneficiar, é ele que é o mais prejudicado com a situação. Algum conselho mais prático para lidar com esta situação?
Cumprimentos,
António Jorge
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