Jogo dirigido e Hermínio Barreto

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Hermínio BarretoUm dos meios fundamentais para que o treinador consiga intervir no jogo de uma forma bem direta e eficaz é o chamado “jogo dirigido”.

Hoje vou apenas trazer para este texto duas citações significativas sobre este instrumento importantíssimo da panóplia  que os treinadores de desportos coletivos dispõem para desenvolver a capacidade de jogo dos jogadores, muito baseado na intervenção sobre a capacidade de leitura do jogo.

As duas citações distam temporalmente uma da outra, três dezenas de anos, mas nelas percebe-se aquela capacidade de ver onde e como atuar no treino. Tanto a de 1959 como a 1989 integram-se na corrente designada do “ensinar jogando” e assumiam a tentativa de superação dos dois problemas principais das metodologias analíticas do ensino dos jogos: a sua falta de atratividade para os aprendizes, por um lado, e uma notada incapacidade de realizar o transfert do ensino das técnicas, vistas como gestos de campeões a reproduzir, para o jogo real.

Assim, em 1959, num livro francês de autoria coletiva coordenado pelo professor e treinador Auguste Listello, referia-se que “o jogo dirigido é um excelente procedimento de iniciação e de treino, na condição de ser utilizado de modo pedagógico”. As condições a respeitar para retirar dele todo o seu potencial são: “Não se contentar de arbitrar; focar a atenção dos alunos sobre um ponto preciso. Exemplo: a marcação e sobre o qual se farão críticas e correções; aconselhar ou criticar brevemente sem parar o jogo; quando é necessário, saber parar o jogo no momento preciso onde uma correção importante se impõe obtendo que cada aluno conserve ou retome o lugar que ocupava no momento da paragem; quando esta paragem pedagógica não coincide com uma violação das regras, pode-se convencionar de dar dois toques com o apito.” (Listello, 1959)
Trinta anos depois, os professores Hermínio Barreto e Mário Gomes referiam que "preocupação permanente é... a de conseguirmos que os jovens percebam o porquê das acções que realizam, enquanto jogam.

Ser capaz de "ler o jogo" é fundamental para que o praticante seja eficaz nas suas acções. É a leitura de jogo que permite que as respostas sejam as mais adequadas à situação. Trata-se de uma capacidade tão educável como qualquer outra, através da nossa intervenção.

Antes de mais, exigindo sempre que o jogador veja o jogo antes de decidir o que fazer; depois, através de "feed-back" substantivos nas situações de jogo que o justifiquem.
A intervenção deverá ser, como é óbvio, adequada ao nível dos praticantes, devendo estar claro o que já são capazes de "ler" (exigir sempre, não permitir regressão) e o que queremos que aprendam a "ler" em seguida (reforços positivos).

Isto é, o jogo dirigido é um meio essencial para educar a capacidade de leitura de jogo."
(Barreto & Gomes, 1989).

Da primeira citação salientamos a sua praticidade e simplicidade. Na segunda é visível toda uma integração de contributos de conhecimentos, de natureza prática e científica, que três décadas de distância lhe permitem.

Hermínio Barreto Livros

A citação de Hermínio Barreto (e de Mário Gomes) sobre o jogo dirigido, não é aqui feita ao acaso. O professor Hermínio Barreto, para quem o conhece é uma personalidade marcante e fascinante do nosso basquetebol e não só. A sua obra e o seu pensamento pedagógico deveria ser algo de incontornável na formação dos treinadores portugueses. E se há algo em que o professor Hermínio consegue revelar uma soberba maestria, esse algo transparece na sua capacidade de se imiscuir positivamente no jogo dos aprendizes e fazê-lo crescer. Isso só foi possível pela sua soberba capacidade de refletir praxiologicamente sobre o ato pedagógico, respondendo aos problemas com que foi deparando desde que começou a ensinar o jogo, ele que foi também, como jogador, um dos melhores do basquetebol nacional.

Não será a última vez que falamos do professor Hermínio. É de tal modo rica a sua obra feita e a lista dos seus textos  (Barreto, 1971, 1980a, 1980b, 1984, 1987, 2001, 2002, 2004, 1980 ; Barreto & Gomes, 1988 ), assim como os textos que outros foram escrevendo acerca dele (Ferreira, Ferreira, Peixoto, & Volossovitch, 2004; Graça, 2004; Tavares & Graça, 2004) que é uma das personalidades do nosso basquetebol que merece atentos e frequentes retornos. Hoje ficamos por aqui com algumas referências bibliográficas para que aqueles que o desconheçam possam procurar.


Barreto, H. (1971). Basquetebol: (Técnica e Táctica). Educação Física Desportos Saúde Escolar, VII(3), 14-25.
Barreto, H. (1980a). Aperfeiçoamento e formação dos jovens: Algumas considerações sobre a defesa. In Associação Nacional de Treinadores de Basquetebol (Ed.), Seleccionar dirigir preparar as tarefas do treinador: Comunicações do 1º Clinic da ANTB (pp. 181-195). Lisboa: Editorial Compendium.
Barreto, H. (1980b). Metodologia do treino. In H. Barreto (Ed.), Da actividade lúdica à formação desportiva (pp. 105-151). Lisboa: ISEF Lisboa.
Barreto, H. (1984). Estratégia de formação: modelo de desenvolvimento do praticante. Lisboa: ISEF-UTL.
Barreto, H. (1987). A 1ª "técnica" não se ensina e a 2ª... também não. O Treinador, 18, 15-16.
Barreto, H. (2001). Ensino do basquetebol no ambiente de jogo. In F. Tavares, M. A. Janeira, A. Graça, D. Pinto & E. Brandão (Eds.), Tendências actuais da investigação em basquetebol (pp. 195-202). Porto: FCDEF-UP.
Barreto, H. (2002). Orientações para a aprendizagem da habilidade de discriminar distâncias. Situação crítica: defensor do atacante com bola. In S. Ibañez-Godoy & M. Macías-García (Eds.), Novos horizontes para o treino do basquetebol (pp. 137-153). Cruz Quebrada: FMH-UTL.
Barreto, H. (2004). Prontidão desportiva: Equilíbrio entre a capacidade de hoje e as exigências de amanhã. In A. P. Ferreira, V. Ferreira, C. Peixoto & A. Volossovitch (Eds.), Gostar de basquetebol: Ensinar a jogar e aprender jogando (pp. 15-34). Cruz Quebrada: FMH-UTL.
Barreto, H. (Ed.). (1980 ). Da actividade lúdica à formação desportiva: comunicações apresentadas no Seminário de Metodologia do Basquetebol.  . Lisboa: ISEF-UTL.
Barreto, H., & Gomes, M. (1988 ). Aprender basquetebol [Registo video]. Linda-a-Velha: IDAF
Barreto, H., & Gomes, M. (1989). A concretização de uma unidade didáctica em basquetebol. Linda-a-Velha: IDAF.
Ferreira, A. P., Ferreira, V., Peixoto, C., & Volossovitch, A. (Eds.). (2004). Gostar de basquetebol: Ensinar a jogar e aprender jogando. Cruz Quebrada: Faculdade de Motricidade Humana.
Graça, A. (2004). A dosagem da distância: Deixe o possuidor da bola respirar para o jogo poder evoluir. In F. Tavares & A. Graça (Eds.), O basquetebol e a pedagogia de Hermínio Barreto (pp. 71-81). Porto: FCDEF-UP.
Listello, A. (Ed.). (1959). Récréation et Éducation Physique Sportive. Paris: Éditions Bourrelier.
Tavares, F., & Graça, A. (Eds.). (2004). O basquetebol e a pedagogia de Hermínio Barreto. Porto: FCDEF-UP.

 
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