Entrevista com Inês Lopes

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altInês Lopes é a nova seleccionadora portuguesa de basquetebol cadeira em rodas. Campeã europeia (Divisão A) com a equipa de Suécia, ela parte para um novo desafio assumindo a selecção portuguesa na Divisão B. O site Planeta Basket foi falar com ela: Pretendemos dar a conhecer uma treinadora de sucesso, saber como ela vê o futuro e quais são os seus objectivos para esta nova etapa.

O que a motivou para aceitar a convite de ANDDEMOT?
A minha saída de Portugal teve a ver com um sonho meu. O sonho era trabalhar no desporto para deficientes, resultando na participação um dia nos Paralimpicos. Até este sonho se concretizar, queria aprender o mais possível nesta área para, um dia, poder ajudar Portugal a desenvolver-se precisamente nesta área.
Eu decidi não continuar com a selecção da Suécia depois dos Paralimpicos em Pequim. Depois de estar envolvida 10 anos no basquete de cadeira de rodas aqui na Suécia, achei que seria bom tomar um "time-out" e pensar no futuro.
Quando o Victor (Sousa) me propôs o convite para vir trabalhar com a selecção Portuguesa,  despertou-se a possibilidade de poder vir a concluir e a alcançar o resto do meu sonho, isto é, ajudar o meu país a desenvolver-se no basquete de cadeira de rodas.  Tendo a selecção conseguido subir e ficar no Grupo B da Europa motivou-me também a tomar esta decisão. Para mim, isto significa que Portugal tem potencial e desejo de ir mais longe. Mas vai ser preciso muito trabalho. O basquete de cadeira de rodas internacional está cada ano, a ficar mais competitivo. Para alcançar objectivos maiores é preciso, alem de mais recursos da federação, muita dedicação e trabalho da parte dos jogadores.
 
Qual a duração do acordo?
Ainda nada está definido. Vou ter reunião com a ANDDEMOT quando aí estiver em Maio.
 
Quais os objectivos que a ANDDEMOT colocou para esta selecção?
Até agora não há objectivos definidos, nem pela ANDDEMOT, nem por mim e os outros treinadores, nem pelos jogadores. Isto vai só ser possível fazer depois do primeiro estágio após conhecer os jogadores e saber o nível deles.
 
Portugal tem baseado o seu jogo numa grande mobilidade e em defesas com pressão “full court”, provavelmente pela falta de um jogador fisicamente muito forte para o jogo interior, será este o caminho certo?
É-me difícil prenunciar sobre o que a selecção tem feito até agora. Cada treinador tem a sua maneira de jogar com os jogadores que escolheu.
Nós (eu e os outros treinadores) temos primeiro que ver a qualidade dos jogadores que vão fazer parte do 1º estágio em Maio. Depois iremos fazer uma escolha dos jogadores com quem pretendemos trabalhar e então aí vamos saber como jogar tacticamente.
 
Igualmente, o jogo de Portugal tem sido baseado num esquema com pouca rotatividade no 5, onde não se tem abdicado da utilização de dois jogadores de 1 ponto, dois de 4 e um de 4,5 quase em 100% do tempo de jogo, acha possível sonhar com outros resultados desportivos usando apenas este esquema de jogo?
Só vi a selecção jogar em 2005 no campeonato C e nessa altura tinham outro treinador além de outros jogadores com que têm jogado nos últimos anos. Pelo que sei, têm ultimamente jogado 4.5, 4.0, 3.5, 1.0, 1.0. na maior parte dos jogos.  O que a equipa tem feito até agora,  resultou pelo menos na subida e permanência á Divisão B da Europa. Isso é muito bom. Mas cada vez que há mudança de treinador, implica directamente algumas mudanças na gestão duma equipa.
Quando comecei a trabalhar com a equipa sueca em Janeiro de 2005, havia certas semelhanças ao que tem acontecido à nossa selecção nos últimos anos. Mas a minha filosofia é que numa equipa de basquete há 12 jogadores. E cada um tem que dar valor á equipa de alguma forma, senão, não vale a pena serem 12. Se cada jogador seleccionado sabe que lá está porque dá mais valor e é importante para a equipa, acho que vai ser possível conseguir obter objectivos maiores. Foi pelo menos o que aconteceu á Suécia e espero que o mesmo venha a ser realidade com a nossa selecção no futuro.
 
Qual é o estilo de jogo que a Inês prefere?
Eu gosto de jogo rápido, agressivo e simples.
 
Acha possível sonhar com a subida à divisão A?
Para alcançar objectivos grandes há que sonhar á grande, porque assim não há limites!
 
O que acha do nível de basquetebol português em cadeira de rodas?
Infelizmente sei muito pouco do nível de basquete português. Estou agora a receber jogos da nossa liga para ficar mais esclarecida neste aspecto.
 
Que alterações sugeria, fazendo uso da sua experiência internacional, para melhorar a qualidade do nosso campeonato?
A qualidade de um campeonato tem a ver com a quantidade e qualidade de treinos que cada jogador faz sozinho, com a sua equipa, o nível de competência do seu treinador, e o número de jogos de qualidade (jogos com resultados não mais de 10 pontos de diferença) que são jogados por ano. Mais (de tudo) = melhor qualidade.
Digo isto em geral, para melhorar a qualidade de qualquer jogador e campeonato, não só o nosso.
Depois como o nosso desporto é dependente de bom material (a cadeira), há que ver se há melhoras a poder fazer nesta área.
 
Ser mulher e treinadora no mundo de cadeira de rodas é mais difícil do que para um homem? O que a inspira?
Digamos que esta não é a primeira vez que me fazem esta pergunta :-) Não é mais difícil nem mais fácil. Há que haver respeito mutuo entre mim e os treinadores e entre mim e os jogadores. A diferença está em que eu como mulher tenho primeiro que obter resultados positivos para ser aceite e respeitada por aquilo que sei e por aquilo que faço, enquanto um homem não tem que se esforçar tanto de início para ser respeitado. Mesmo que ele saiba menos do que eu sei. Ao princípio, todos pensavam que era a fisioterapeuta, já que se havia uma mulher numa equipa era esse o papel dela. Mas assim que eu dizia que era a treinadora, ficavam todos envergonhados e pediam imensas desculpas. O mundo do desporto é e será sempre machista. O que me inspira é precisamente fazer ver que saber ser um bom treinador não tem nada a ver com o sexo deste, e fazer ver a outras mulheres que deveriam ter mais coragem em seguir o rumo de treinadora de alto nível. Tudo é possível! Inspira-me também eu adorar basquete e o desejo de desenvolver o jogo para níveis ainda não explorados.
 
Para si qual é o melhor jogador e jogadora do mundo no activo? E de sempre?
Para mim, o melhor jogador de hoje e de sempre é o Patrik Andersson, o jogador do Canadá.
É um jogador muito competitivo, dá sempre 100%, é rápido, agressivo, sabe jogar de base como de poste, um bom passador, um óptimo marcador de 1,2 e 3 pontos, e compreende o jogo melhor que ninguém.
 
Sabemos que a Inês vai ser apoiada por um assistente sueco que a tem acompanhado há algum tempo. Será que o pode apresentar aos portugueses, dizer o que espera dele e a mais valia que pode trazer à nossa selecção?
Quando comecei com a equipa sueca em 2005, foi em conjunto com o Nils (Nisse). Sempre nos demos muito bem porque tínhamos a mesma filosofia e os mesmos objectivos ao que queríamos alcançar com a equipa. Após 6 meses de trabalho com a equipa conseguimos ganhar a medalha de bronze no campeonato da Europa. Conseguimos depois alcançar um 6º lugar no campeonato do Mundo e um ano mais tarde a medalha de Ouro no campeonato europeu.
A nossa maneira de trabalhar tem sido com sucesso. Espero que trazendo o Nisse comigo, consegamos fazer o mesmo (senão ainda melhor) trabalho com a nossa selecção como fizemos com a equipa sueca. Tê-lo a ele aqui comigo na Suécia vai-me também ajudar na preparação da nossa equipa entre estágios e torneios em Portugal.
 
O que acha do site Planeta Basket? O que pode ser melhorado?
Gostava que se pudesse apresentar também os jogadores da nossa modalidade, dizendo eles o que os inspira a jogar, o que eles acham dos jogos que jogam. São eles os protagonistas do nosso jogo, seria bom dar-lhes uma voz no site para os Portugueses saberem o que é o basquete em cadeira de rodas.
Gostava também que se pusesse jogos nacionais e internacionais para os jogadores verem o jogo ser jogado a outro nível. Aprende-se muito ao ver-se a si próprio e a outros jogar.
 
Uma mensagem para os leitores do Planeta Basket:
O basquete de cadeira de rodas é um desporto para atletas e não um desporto para deficientes!
Vai ser uma honra para mim poder finalmente representar o meu próprio país. Vou dar o meu possível e impossível, juntamente com aqueles que me vão ajudar, para melhorar a qualidade dos jogadores e do nível de jogo português. Espero que consigamos trabalhar a 100% para mostrar aos portugueses que além do futebol, o outro desporto mais excitante do mundo é o basquete de cadeira de rodas! Há que ver para crer!

 

 
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