Depois da apresentação de ontem de uma das duplas mais marcantes do basquetebol português, veja em seguida a entrevista com os dois irmãos Coelho.
Antes de mais, passamos a explicar que esta entrevista foi feita em separado e que tanto o José Carlos como o Tozé respondeu às mesmas perguntas sem ter a noção das respostas do outro. Em baixo apresentamos as respostas de cada um a cada uma das nossas questões numa entrevista inédita, repleta de curiosidades e de história. A não perder em exclusivo no Planeta Basket.
Em primeiro lugar obrigado por teres aceite o desafio do Planeta Basket. A que se deveu a escolha pelo basquetebol? Alguém (quem) te influenciou a escolher esta modalidade? E já praticavas algum outro desporto antes de te decidires pelo basket?
TZ: A escolha deveu-se ao facto de na Escola Francisco Arruda ter como professor de ginástica o Prof. João Coutinho. O outro desporto que praticava era Andebol que treinei no Boa-Hora e joguei no Sporting nas categorias de Juvenis e Juniores e nos seniores do Império do Cruzeiro.
JC: Fui influenciado por um colega do Liceu D. João de Castro, Carlos Martens e pelo seu pai, que me levaram a jogar federado pela primeira vez no CDUL. Centro Desportivo Universitário de Lisboa, onde fui dirigido por um nome grande na modalidade, de nome Evaldo Poli. Eu sempre pratiquei duas modalidades ao mesmo tempo. Neste caso praticava andebol. Inicialmente joguei no Boa Hora, depois Sporting, Benfica e por último, já “reformado“ Império do Cruzeiro (Ajuda).
Qual foi o teu primeiro jogo oficial e com que número na camisola o jogaste?
TZ: Oficial foi no Atlético Clube de Portugal por influência do Eng. Viegas e por o meu pai ter sido sócio do ACP. Joguei sempre com o nº6 até aos seniores do SIMECQ e depois sempre com o número 14 no SLB, Barreirense, Belenenses e CAB.
JC: O meu primeiro jogo oficial foi contra o CIF dirigido pelo Prof. Mário Silva, que mais tarde veio a ser meu colega no Benfica, e joguei com o número 13.
Porque decidiste mudar para o SIMECQ?
TZ: Porque desde os 10 anos que fui residir para a Cruz-Quebrada e na altura eram difíceis as deslocações para os treinos em Alcântara. E já tinha um círculo de amigos na área de residência que também jogavam a modalidade.
JC: Após sair do CDUL e convidado pelo Atlético para ir jogar para os seniores com 16 anos , dirigido pelo Sr. Alberto Costa, tinha sido um dos melhores árbitros portugueses, onde fiz um época com uma excelente aprendizagem, decidi dedicar-me quase a tempo inteiro ao andebol. Como queria continuar, também a jogar basquetebol, nas horas vagas, decidi-me pela SIMECQ (Cruz Quebradense). Consegui ser por duas vezes campeão nacional de Juniores pelo Sporting e depois, tendo subido aos seniores, ainda consegui ganhar uma Taça de Portugal e ser campeão nacional de seniores numa equipa que foi penta campeã nacional e que tinha grande vedetas na altura, casos de Bessone Basto, Carlos Brito, Carlos Correia, Carlos Silva, Frederico Adão e muitos outros. Aqui consegui ser internacional. Sempre joguei com o nº 2.
O que significa o SIMECQ para ti?
TZ: Descobrir o que é o exemplo de jogar com amor à camisola. Porque é que ainda existem jogadores, treinadores e dirigentes que amam o que fazem e se movimentam apenas por carolice. Foi aí que eu descobri o que era pagar para jogar.
JC: A SIMECQ significa honra, orgulho, prazer, amizade para toda a vida, entreajuda e muita carolice. Nunca poderei esquecer o grande impulsionador de todo o basquetebol da SIMECQ e grande responsável por toda uma vida desportiva e profissional de algum sucesso, Sr. Carlos Alberto Franco de Carvalho.
O que recordas da época em que subiram à 1ª divisão com o SIMECQ, ano em que disputaram a final com a Ovarense?
TZ: A união e o entusiasmo da equipa e das pessoas que nos acompanhavam e de jogar contra jogadores americanos pela primeira vez.
JC: Muitas alegrias pessoais e principalmente aquelas pessoas que sempre nos acompanhavam para todos os locais onde jogávamos.
As duas épocas no Benfica marcam o teu currículo. Qual foi o momento que mais te marcou na experiência encarnada?
TZ: 1ª Um torneio que disputámos em Londres em Cristal Palace com um dos melhores americanos que jogou em Portugal o Peter Harris. Era tão bom que ficou logo por lá e já não regressou connosco. 2ª Uma digressão que efetuámos aos Açores organizada pelo nosso treinador o Prof Eduardo Monteiro. 3ª O acidente do autocarro do clube.
JC: Dois momentos. Um agradável e um desagradável. Um torneio disputado em Londres onde jogamos com muitos jogadores de grande classe e que mais tarde foram vedetas na NBA e o acidente que tivemos com o autocarro do Benfica.
Mais tarde integraste a brilhante equipa do Barreirense. O que distinguia esta equipa, ao ponto de ficar na história do basquetebol português?
TZ: A força, o entusiasmo e a dinâmica dos seus dirigentes e apoiantes e a qualidade técnica dos jogadores e treinadores.
JC: Os anos passados no Barreirense classifico-os como os melhores anos que tive na minha vida desportiva, tanto ao nível do andebol, como do basquetebol. Esta equipa era formada por jogadores muito bons tecnicamente, muito velozes e muito experientes. Sobressaíam dois grandes jogadores, infelizmente já falecidos, Adilson do Nascimento e Mike Plowden. O público que nos acompanhou ao longo desses anos era fantástico.
O que te lembras do famoso jogo da final entre o FC Porto e o CF Barreirense que não acabou por falta de segurança no recinto?
TZ: Lembro-me de muitas coisas que se passaram mas a mais marcante foi a insegurança que existiu e a falta de controlo por parte das autoridades.
JC: Como se fosse hoje - muita insegurança, demasiado fanatismo e um ambiente preparado para atemorizar. Os adeptos do Barreirense foram literalmente postos fora do Pavilhão. Penso que hoje isso seria impossível de acontecer.
Como é jogar lado a lado com o teu irmão?
TZ: Muito simples. Os processos eram sempre simplificados. O objetivo era pôr a bola dentro do cesto.
JC: Fácil - aproveitamento dos erros e das distrações dos adversários. Muito prazer.
Quais eram as características do teu irmão enquanto jogador, que mais valorizavas? Quais eram os seus pontos fortes como jogador?
TZ: Altruísmo, anti vedetismo, companheirismo e líder. Eu considerava que os 35 pontos de média que eu obtive várias épocas, vinte eram do meu irmão. Em quase todas as situações ele preferia passar-me a bola para ser eu a marcar do que marcar ele. Em outras situações e em igualdade de circunstâncias de linhas de passe a bola vinha para mim e não para outro colega. Ele tinha muita confiança em mim e para ele era garantia de cesto obtido porque ele “obrigava-me” a não falhar.
Tecnicamente era excelente. Ninguém lhe “roubava” bolas e bastava pensar e colocava a bola onde queria sem olhar. Era sempre o maestro da equipa. Organizava e punha a equipa a jogar conforme mandavam os treinadores. Era mestre no passe e no contra ataque. Ele não precisava de treinar muito para jogar sempre bem.
JC: Inteligência, velocidade, bom aproveitamento das regras do jogo, conhecimento do jogo, conhecimento do adversário, canhoto, excelente meia distância, sem medo, boa consistência física e muita resistência - a mais importante de todas era conhecer muito bem o irmão….!
Dizia-se que vocês os dois usavam uma sinalização própria. É verdade?
TZ: Não existiam sinais combinados. O que existia era conhecimentos muito profundos sobre pormenores interiorizados automaticamente nos treinos e jogos. Eram estilos muito próprios e diferentes que se complementavam dentro do campo.
JC: Nós conhecíamo-nos muito bem, entendíamos o jogo da mesma forma. Bastava um olhar ou um pequeno tique para que ele aparecesse no sitio certo, à hora (segundo) certa. E tentávamos aproveitar todas as distrações e erros dos adversários.
O Planeta Basket desafia-te agora a fazer o 5 ideal da tua geração, respeitando as posições:
TZ: Eram muitos e bons jogadores da minha geração que não cabem apenas em um “5” mas qualquer selecção poderia contar com os abaixo indicados:
António Almeida, Carlos Lisboa, Rui Pinheiro, Eustácio Dias e Mike Plowden.
JC: Dois cincos:
- Mike Plowden, Eustácio Dias, Carlos Lisboa, José Luis, Rui Pinheiro;
- José Parente, António Coelho, António Almeida, Tó Ferreira, Artur Leiria.
(peço desculpa a todos os outros grandes jogadores com quem joguei e que muito admirei)
Qual foi o adversário mais difícil de defrontar enquanto jogador? Porquê?
TZ: Um dos mais difíceis foi o Nelson Serra. Lançava de qualquer sítio do campo com percentagens elevadíssimas. Cheguei a vê-lo lançar ao cesto em contra-ataque 1 contra 0, de meia distância. Não precisava de ir debaixo do cesto para averbar pontos. Observei jogos dele na Seleção Nacional em que todos faziam bloqueios consecutivos para ele lançar quando estavam aflitos para marcar pontos.
JC: José Luís Almeida - existia alguma diferença física e era um jogador com uma técnica muito apurada. Excelente meia distância. Bom colega.
Qual foi o treinador que mais te marcou e porquê?
TZ: Nos escalões de formação foi o Prof. Orlando da Ponte e nos seniores foi o Prof. Manuel Fernandes.
JC: Tive dois - Prof. Orlando da Ponte e Prof. Manuel Fernandes. O primeiro porque era difícil dirigir e motivar uma equipa como o Cruz Quebradense onde à partida todos os jogos seriam para perder (claro que isso não aconteceu). O Prof. Manuel Fernandes pelos seus conhecimentos técnicos e pela forma de lidar com todos aqueles jogadores muitos deles internacionais e com diferentes formas de estar e de ser.
O que motivava os jogadores daquele tempo a praticar desporto e em particular o basquetebol?
TZ: Eu passava os meses de férias da escola com os meus amigos a jogar 2x2 e 3x3. Bastava uma bola e um cesto ao ar livre. Não havia computadores, telemóveis nem internet. Combinava-mos jogos de futebol na praia de manhã e basket à tarde. O basquetebol era a modalidade rainha na Cruz-Quebrada.
JC: Inicialmente, era uma distração, depois um vício, um bom vício. Mas acima de tudo era uma escola de virtudes.
O que pensa do site Planeta Basket?
TZ: É um meio ótimo de divulgação da nossa modalidade.
JC: Excelente a forma como divulgam a modalidade e o carinho que dedicam aos “velhos“.
Por fim, deixe aqui a sua mensagem para os leitores do Site Planeta Basket:
TZ: Nunca deixem de ir aos pavilhões ver jogos de basquetebol.
JC: Vão as Basquete - é deprimente não só para os jogadores mas também para os antigos jogadores e adeptos verificar que os pavilhões estão “às moscas“.
Um grande abraço para todos e vemo-nos por ai!
Comentários
Saudosa dupla que fizeram sonhar algumas gerações da Cruz Quebrada e não só.
Um grande abraço amigos por manterem este espirito da SIMECQ
Cristina (Veteranas SIMECQ)
Seria um enorme prazer receber a vossa visita no actual Pavilhão "Carlos Alberto Carvalho".
Apenas acompanhei a carreira de árbitro do Tozé. Um dos melhores que cá tivemos. E continua a ser uma mais valia para os árbitros mais jovens, pois no papel de observador é dos poucos que demonstra profundo conhecimento da modalidade.
Já agora, gostei de ver a cabeleira que usava no SIMECQ
Muitos parabéns ao planetabasket por manter viva a memória destes dois bons exemplos.
Parabéns ao Planeta Basket por manter viva a modalidade